O VALOR DE UMA EXCEPÇÃO
O BISPO D.JANUÁRIO TORGAL FERREIRA, VOGAL DA COMISSÃO EPISCOPAL
E BISPO DAS FORÇAS ARMADAS E DE SEGURANÇA.
Estamos de facto a viver tempos de mudança extraordinários.
Uns bons, outros nem por isso.
No que se refere á Igreja e nomeadamente á religião, são para nós verdadeiramente surpreendentes as declarações deste bispo das Forças Armadas, D.Januário Torgal Ferreira, numa entrevista que deu á TSF.
Logo na sua primeira declaração, coloca o assento tónico na análise que faz da actual situação política, dizendo “ipsis verbis”,
“TENHO VERGONHA DESTE PAÍS”.
Perante esta surpreendente afirmação o entrevistador inicia uma deprecada série de perguntas, que escondem não só a surpresa da resposta, como escondem uma psicológica censura prévia, que o desresponsabilize como conivente.
A exigência que imediatamente coloca de saber o
“PORQUÊ ?”, na sequência de querer ligar aquela poderosa afirmação, à suspeita que tal implica, de também ter vergonha da Igreja Católica de que ele é um membro destacado, é atraiçoada pela repetida questão:
“QUANDO DIZ QUE TEM VERGONHA DESTE PAÍS, QUER DIZER QUE TAMBÉM TEM VERGONHA DESTA IGREJA CATÓLICA ?”
A formulação agressiva desta pergunta, mais do que reflexo da natural actuação de um profissional rigoroso, denúncia claramente o choque que tal afirmação lhe causa e a psicológica critica que subconscientemente ela lhe inspira.
Perante esta primeira pergunta D.Januário, prisioneiro das suas responsabilidades religiosas, embora titubeando a resposta, esclarece utilizando a seguinte imagem literária:
UMA CASA ONDE OS MAIS PEQUENOS NÃO SE PODEM SENTAR À MESA E COMER O MESMO PÃO, QUE É O PÃO DOS DIREITOS E QUE É O PÃO DA DIGNIDADE”
Acrescentando:
“QUEM ESTIVER A PRESIDIR À MESA, DEVE SENTIR-SE CÚMPLICE E SE DE FACTO NÓS NOS DIZEMOS IGREJA, SERVIDORES DO MUNDO, IRMÃOS DE TODOS, EU DEVO SENTIR-ME CÚMPLICE E NÃO DEVO DORMIR TRANQUILO PERANTE TODA ESTA MULTIDÃO DE PESSOAS, QUE JÁ FORAM DESAPOSSADAS DA SUA MESMA DIGNIDADE, DO RESPEITO POR ELAS PRÓPRIAS E A QUEM AS PROMESSAS VÃO NO PIOR SENTIDO.
À segunda, responde cautelosamente dizendo:
AQUI, JÁ NALGUMAS ALTURAS DA MINHA VIDA, EU TIVE VERGONHA DA IGREJA CATÓLICA, DAS SUAS PESSOAS.
É evidente que a conversa estava azeda para o entrevistador, e perante a audácia do entrevistado, que relatou não só a vergonha que foi a atitude da Igreja perante o Salazarento reinado que acolitou o Cerejeiral cardeal, trouxe para a actualidade o problema de um dos dogmas mais resistentes da Igreja católica que é a discriminação da Mulher no que se refere ao exercício sacerdotal.
D. Januário, teve neste desiderato a coragem de discordar do comportamento da Igreja e nomeadamente do Papa, que obrigou o nosso cardeal patriarca, D. José Policarpo, a corrigir afirmações que anteriormente tinha feito nesse sentido, embora D Januário tenha considerado cautelosamente:
QUALQUER PADRE TEM QUE ESTAR EM COMUNHÃO COM A IGREJA E COM O PAPA, MAS ESTAR EM COMUNHÃO COM A IGREJA, MESMO NUM DOCUMENTO DE MAGISTÉRIO, EU OUSO PENSAR “NÃO SERÁ POSSÍVEL REPENSAR UMA DECLARAÇÃO DOGMÁTICA?”.
A partir deste raciocínio, elaborou mais uma série de justificações críticas ao comportamento da hierarquia católica em matéria de actos e dogmas religiosos, passando para o campo das coisas práticas e temas políticos, tendo como base os problemas inerentes à justiça social.
Se anteriormente tinha expresso brilhantes conclusões, sobre a dignidade humana e as violências que a os mais pobres e desprotegidos estão sujeitos, avança então com mais uma revolucionária evocação, tanto mais revolucionária porquanto vinda de um bispo da Igreja católica:
“FALAR EM TERMOS PARTIDÁRIOS EM JUSTIÇA SOCIAL… PARECE QUE SÓ O PARTIDO COMUNISTA. PORTANTO UM PADRE OU UM BISPO QUE TOQUE NESSES PROBLEMAS E HONRA LHE SEJA FEITA, GOSTEM OU NÃO GOSTEM É O PARTIDO COMUNISTA QUE TOCA NOS PROBLEMAS DOS MAIS MISERÁVEIS E A IGREJA DEVIA TOCAR, PORQUE O NASCIMENTO DE JESUS CRISTO É MUITO ANTERIOR AO NASCIMENTO DO PARTIDO COMUNISTA”
Perante o espanto do entrevistador que deve certamente atribuir a exclusividade desta matéria aos ambientes agnósticos, ou laicos, interroga rudemente o bispo com esta mortífera questão, que pensa certamente o irá colocar entre a espada e a parede:
QUER O SENHOR BISPO DIZER QUE OS COMUNISTAS SÃO MAIS CATÓLICOS, QUE OS PRÓPRIOS CATÓLICOS?
O senhor bispo a esta provocatória pergunta, responde num tom admirativo e afirmativo.
EM MUITOS ASPECTOS SÃO CAPAZES DE SER. AÍ EU NÃO TENHO DÚVIDAS. EM MUITOS ASPECTOS HÁ COMUNISTAS QUE SÃO MUITO MAIS CATÓLICOS QUE MUITOS CATÓLICOS QUE CONHEÇO.
“MAS ELES NÃO GOSTARIAM DE OUVIR ESTA DEFINIÇÃO!!!”,
replica o entrevistador, demonstrando uma séria reserva mental, sobre o tema e indefinindo certamente com o “eles”, os correligionários do seu pensamento.
Aí, D.Januário, sentindo o peso da subjectiva pergunta, responde tranquilamente:
NEM EU QUERO DE FORMA ALGUMA SER FONTE DE VITUPÉRIO E DAR AOS OUTROS ADJECTIVOS QUE ELES NÃO QUEREM ASSUMIR.DO PONTO DE VISTA HUMANO DE CIDADANIA EU NÃO TENHO QUALQUER DUVIDA E REPARE, SABE MUITO MAIS DO QUE EU: ALGUÉM QUE TOQUE EM ASPECTOS SOCIAIS, É DE ESQUERDA.
ISTO É HORRÍVEL.
HONRA A QUEM É DE ESQUERDA….HONRA!!!
Após estas judiciosas considerações, interroga-se D.Januário:
PORQUE É QUE SÓ EM MOMENTOS ELEITORAIS SE VAI PARA AS FEIRAS?
PORQUE É QUE SÓ EM MOMENTOS ELEITORAIS SE VAI PARA BANHOS DE MULTIDÃO?
PORQUE É QUE SÓ EM MOMENTOS ELEITORAIS SE DÁ BEIJINHOS NA GENTE MAIS HUMILDE E ECONOMICAMENTE MAIS DÉBIL E SOCIALMENTE SEM SANGUE AZUL…
A continuidade destas interrogações que D.Januário coloca é intempestivamente interrompida pelo entrevistador que o questiona, paradoxalmente, com variadas afirmações contabilísticas, onde se pode constatar que:
COM A INFLUÊNCIA DA IGREJA PODIA-SE CONTAR EM CADA DOMINGO COM 13.000 HIPOTESES DE COMUNICAÇÃO, REPRESENTADAS PELAS 13.0000 MISSAS QUE CELEBRA EM CADA DOMINGO, ONDE MOBILIZA “UMA FRENTE DE OUVINTES” QUE ALIMENTAM A IGREJA NO CAMPO SOCIAL PARA MUITOS MILHARES OU MILHÕES DE PESSOAS.
Ante esta autêntica chantagem emocional, não resta alternativa a D.Januário Torgal Ferreira senão justificar-se, antes que pela pressão daquele inquisitorial interrogatório, se confundisse o seu raciocínio, com alguma intemperança no seu múnus sacerdotal, afirmando:
EU TENHO DE PRESTAR HOMENAGEM ÀS ESTRUTURAS QUE AO LONGO DO PAÍS, AO LONGO DE PORTUGAL; CENTROS SOCIAIS, CENTROS PAROQUIAIS PARA CRIANÇAS, PARA IDOSOS, PARA TODA UMA GAMA DA POPULAÇÃO, EU TENHO DE PRESTAR HOMENAGEM AQUILO QUE É FEITO, AQUILO QUE É EXEMPLIFICADO, COM CERTEZA TAMBÉM COM O NOSSO DINHEIRO, COM O DINHEIRO DA POPULAÇÃO……
“ E EM MUITOS CASOS DA PRÓPRIA SEGURANÇA SOCIAL”
(as aspas, são da nossa responsabilidade!!!)
Talvez pouco satisfeito com a parte final da resposta o inquisidor entrevistador regouga:
ESQUECE A CARITAS E AS MISERICÓRDIAS.
Já se tendo apercebido há muito, das armadilhas que o profissional da manipulação lhe estava a armar, mantendo a sua rara dignidade intelectual, esclarece quem não sabia:
CLARO QUE NÃO ESQUEÇO A FORÇA DA CARITAS E A FORÇA DAS MISERICÓRDIAS. NÃO DISTINGO NADA, PORQUE EU PESSOALMENTE ACHO QUE A NOSSA GRANDE LACUNA É NÓS QUERERMOS MATAR A FOME E DEVEMOS MATÁ-LA. O QUE AINDA NÃO CONSEGUI ENTENDER É O SILÊNCIO DOS LEIGOS, LEIGAS, PADRES E PORVENTURA DE BISPOS.
Encurtando as razões invocadas pelo bispo D.Januário para lastimar a ausência de uma linguagem que defenda os direitos humanos, recordando que há encíclicas papais que abordam o tema, debruça-se sobre a necessidade de uma mudança de mentalidades, mais de acordo com uma
REVOLUÇÃO SOCIAL que se torna necessária, para que o respeito pelos direitos humanos, seja uma forma de evitar que se tenha de estar a matar a fome às pessoas.
Termina esta lúcida personagem, emitindo a sua opinião sobre as greves, dizendo:
HÁ AFIRMAÇÕES DE QUE NÃO GOSTEI: POR EXEMPLO SOBRE A GREVE. DIZEM PARA TER CUIDADO. ENTÃO AS POPULAÇÕES AINDA VÃO SER MAIS DIZIMADAS. A GREVE DEVE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO ULTIMO.
É COMO A GUERRA. EU SOU CONTRA A GUERRA, MAS EM EXTREMISMOS QUE NÃO HAJA OUTRA SOLUÇÃO COMO POR EXEMPLO EM TIMOR LESTE? EU VOU DEIXAR EXTERMINAR AS POPULAÇÕES?
ESTES TIPOS QUE ESTÃO A DIZER NÃO À GREVE, ESTÃO A SER PORTA-VOZES DO GOVERNO E A DIZER AO POVO QUE SE COMPORTEM BEM E QUE NÃO HAJA TUMULTOS NA RUA.
NÃO GOSTO!!!
EU ACHO QUE HÁ MOMENTOS PARA CALAR E MOMENTOS PARA FALAR!
Certamente por não concordar com o prelado e na estulta intenção de mudar o rumo à conversa, adiantou o néscio entrevistador:
MAS NÃO TEME QUE POSSAM EXISTIR MOMENTOS DE TUMULTOS SOCIAIS, TENDO EM CONTA TODA ESTA PANORÂMICA QUE JÁ DESCREVEU SOBRE A SITUAÇÃO.
Ao que D.Januário esclareceu, como se fosse necessário:
CLARO QUE EU NÃO QUERIA TUMULTOS.
CLARO QUE EU PESSOALMENTE GOSTARIA DE DIZER QUE NÃO HAJA MOMENTOS QUE LEVASSEM A TUMULTOS.
EU TENHO ASSISTIDO A MANIFESTAÇÕES DE ORGANIZAÇÕES INEQUÍVOCAS, SEM AS MÍNIMAS SEQUELAS, CONTRA A CIDADANIA.
Perante esta brilhante e perspicaz sentença, só nos resta aproveitar esta sua ultima preclara e humilde recomendação de ler vozes discordantes, como a de Frei Bento Domingues, com quem confessa tem aprendido muito, rematando
EU ACHO QUE É UMA GRAÇA PARA PORTUGAL, O FREI BENTO DOMINGUES
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