MORREU
JOSÉ CASANOVA
Estou
muito triste!
Soube
agora que morreu esta noite, o meu amigo e camarada José Casanova
Bem
sei que morrer é o corolário natural da lei da vida, mas há pessoas que pelo
seu comportamento e pelo seu valor, fazem tanta falta à humanidade, que tornam
essa regra profundamente injusta.
José
Casanova é um caso, onde a vulgar classificação de perda irreparável, tem o seu
mais profundo significado.
Para
nós, ele faz parte daquela lista de militantes desaparecidos, na linha de um Zé
Magro, Octávio Pato, ou Álvaro Cunhal, que fazem parte do Quadro de Honra dos
dirigentes mais notáveis que a ideologia comunista gerou e que deram
continuidade e exemplar significado ao Partido Comunista Português.
Extraordinariamente
inteligente, perspicaz, lúcido e culto, era de uma humildade afável e cativante,
com a uma capacidade rara de apreender o essencial dos problemas e sintetizar a
resposta necessária.
Jamais
esquecerei, quando na segunda volta das eleições presidenciais de Janeiro de
1986, se deparava aos comunistas a opção entre Diogo Freitas do Amaral e Mário
Soares, foi entendido pelo Comité Central do PCP, que se deveria optar por
votar em Mário Soares, para evitar de entregar a presidência da República aos
fascistas, personalizado na ocasião, por Diogo Freitas do Amaral.
Foi
nessa ocasião que se deu a salomónica solução preconizada por Álvaro Cunhal,
quando interrogado por uma peixeira em quem deveria votar e lhe foi aconselhado
que colocar a cruzinha em Mário Soares, ao mesmo tempo em que com a mão…tapasse
a cara dele.
Aquela
decisão do Comité Central, causou como se sabe, enorme desconforto na grande
massa de militantes do PCP, derivado à repulsa instintiva que já na ocasião,
causavam a personalidade e as atitudes de Mário Soares.
Eu
próprio, quando me disseram que a opção seria votar Mário Soares, apesar de
toda a minha estrutura mental ser disciplinadamente comunista, disse aos camaradas
que me confidenciaram tal resolução, que pela primeira vez me via obrigado em
consciência, a desobedecer a uma orientação do Comité Central, coisa para mim até
aí, absolutamente impensável.
Nessa
noite, tendo sido solicitada uma reunião de urgência, no Centro de Trabalho
Victória foi esta dirigida pelo camarada José Casanova.
Com
a sala cheia a deitar por fora, durante a reunião, vozes vociferantes ameaçavam
rasgar o cartão de militantes, a par de outros que entre lágrimas de raiva,
expressavam barbaridades, só admissíveis em camaradas revoltados e de cabeça
perdida.
Aproximando-se
a meia-noite e porque muitos camaradas não tiveram ocasião de falar, foi
decidido continuar a reunião no dia seguinte.
Tomada
esta decisão, foi tempo do camarada José Casanova fazer a intervenção final, analisando
a situação criada, o tipo de argumentos aduzidos e encerrando a sessão, com um
esclarecimento exaustivo das motivações que tinham levado o Comité Central a
tomar aquela polémica decisão.
Foi
de tal maneira convincente e a argumentação de tal modo clarividente e esmagadora,
que no dia seguinte os mesmos camaradas que entre outras tropelias, juravam
abandonar o Partido, muitos deles entre lágrimas emocionadas, confessavam que
afinal sempre iriam votar Mário Soares. Alguns chegaram mesmo a comovidamente, titubear
o orgulho que tinham no seu partido, o glorioso Partido Comunista Português.
Esta espantosa viragem, ficou-se indiscutivelmente
a dever ao talento e capacidade argumentativa de José Casanova, ao expressar de
maneira clara e convincente, as razões subjacentes à decisão do Comité Central,
naquela dificílima situação.
Assim
Mário Soares pode ganhar as eleições com uma diferença de apenas 140.000 votos,
graças aquela deliberação do Comité Central do PCP, evitando o efectivo perigo
que representava na altura, a subida à presidência da República, de Diogo Freitas
do Amaral.
É
um facto que a Diogo Freitas do Amaral com o tempo deixou crescer umas asinhas
brancas, no sentido de disfarçar a sua natureza de classe, bem como o tipo de
opções políticas que com ele seriam desenvolvidas, em prejuízo dos
trabalhadores e das classes mais exploradas deste país.
Qual
seria o rumo da história, se naquela ocasião não tivesse o talento de José
Casanova alterado o clima em que aquelas larguíssimas centenas de militantes,
extremamente representativos e influentes, viviam o drama de votar Mário
Soares?
Pelo meu lado, fico-lhe a
dever não só esse voto não me ter ficado a pesar na consciência, como também por
influência sua, ter tido um dos dias mais felizes da minha vida, ao abandonar a
minha vida profissional e tornar-me a tempo inteiro, um orgulhoso funcionário
do Partido Comunista Português.
Obrigado por tudo José
Casanova!!!
Paz à sua alma e
inesquecível memória!!!
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