Mensagem

Mensagem

segunda-feira, 21 de março de 2011

ISLÂNDIA

E AGORA? O QUE SE SEGUE?


Recebemos um texto enviado por um amigo, que abordava a crise financeira da Islândia e nos despertou imensa curiosidade quer pelas relativas parecenças com a questão da nossa “dita” dívida soberana, quer pela solução que o povo islandês propõe e que nos devia servir de inspiração.
Começava o referido texto:

“Por incrível que possa parecer, uma verdadeira revolução democrática e anticapitalista ocorre na Islândia neste preciso momento e ninguém fala dela, nenhum meio de comunicação dá a informação, quase não se vislumbrará um vestígio no Google: numa palavra, completo escamoteamento” .
E mais adiante:
“Quando retumba na Europa inteira a cólera dos povos sufocados pelo garrote capitalista, a actualidade desvenda-nos outro possível, uma história em andamento susceptível de quebrar muitas certezas e sobretudo de dar às lutas que inflamam a Europa uma perspectiva: a reconquista democrática e popular do poder, ao serviço da população.”
Estas afirmações terminavam com a indicação dois links de textos em francês, onde se relatavam esses acontecimentos.
O primeiro era um texto de Jean Tosti que faz um relato dos acontecimentos e o outro referente ao Blogue "Paris s'éveille" que analisa o texto de Jean Tosti, acrescentando-lhe mais alguns elementos que nos permitem aprofundar a investigação.
Como acima referimos, dadas as semelhanças com a situação financeira de Portugal, achámos importante não só traduzir os textos, para facilitar a quem não saiba francês, como investigar a evolução que o processo teria sofrido, dado que os factos a que os links se referiam, já terem ocorrido há algum tempo.
Nessa investigação, encontramos um segundo texto de Jean Tosti muito recente (escrito em 9 de Março passado), que nos dá uma ideia clara da situação actual do problema e que pela sua importância também o traduzimos e publicamos mais em baixo.
Finalizamos expressando um voto, que esperamos seja também o seu, depois de ler os textos conclua como nós:

“quem nos dera que os portugueses procedessem da mesma maneira”.

Tínhamos um futuro brilhante, á espera dos nossos filhos e netos!!!

BLOGUE “PARIS S’ÉVEIILE”

ISLÂNDIA

REVOLUÇÃO

A Assembleia Constituinte foi eleita em Novembro
Um dia, alguns meses atrás, um inglês ao passar por Paris, num encontro na livraria “Lady Long Solo”,( rue Keller, nº 38 ) foi alertado para uma revolução na Islândia.
Que revolução? Nunca tínhamos ouvido falar disso em parte alguma.
Hoje, uma rápida procura no Google não deu em nada, nem em associação com a palavra "revolução" ou "crise".

Só se encontram detalhes sobre a crise financeira, que de facto está na origem desta revolução que teve lugar em 2008.
Este país de pouco mais de 300.000 habitantes, em 2006, em vésperas desta revolução, estava classificado em segundo lugar no índice mundial do desenvolvimento humano, o IDH, atrás da Noruega.
Confrontado então com a falência brutal do Sistema Bancário, o povo desceu á rua.
Coisa nunca vista no país dos géisers de água quente.
A direita teve então de ceder lugar á esquerda. E para começar, os bancos foram nacionalizados.

O nosso informador inglês tinha ouvido falar de projectos legislativos de liberdade total para sites da Internet, de tal modo que os sites ingleses pensavam em se albergar ali.
Mais importante, ele insistia em falar de uma verdadeira revolução, sem a poder descrever e de que jamais ouvi falar.
Procurando obstinadamente, conseguimos finalmente ver imagens do palácio presidencial cercado por uma multidão que qualificaria sem hesitar de anarco-autónoma.
Alem das bandeiras negras, podia-se adivinhar uma multidão com uma forte componente ecologistas.
Um pobre desgraçado polícia, sozinho diante do palácio presidencial, teve de se render rapidamente, sob a pressão da multidão.
Esta, pacificamente somente usava tachos e outros objectos barulhentos, conforme o tinham feito os argentinos, que também tinham ficado na miséria.
O governo tinha feito as malas. Um novo governo foi estabelecido.
Mas, algum tempo depois, teve a má ideia de propor o reembolso total da dívida aos bancos britânicos e dinamarqueses.
O povo desceu á rua de novo.. Um referendo sobre a questão foi imposta pela vontade popular, e uma pequena maioria de 93% rejeitou o acordo previsto pelos gentis governantes.
Entre as informações recolhidas, surpreende a imagem de nos banhos públicos, nas águas quentes, o povo reúne-se a cada manhã, para debater como refazer o mundo.
A consagração desta revolução, foi a eleição de uma Assembleia Constituinte em 27 de Novembro 2010, acontecimento talvez mais importante que a noite de 4 de Agosto de 1789, quando foi votada a abolição dos privilégios da nobreza, da qual não nos teríamos apercebido, sem a leitura das dicas do nosso amigo B.Bec de Gers, relendo o CADTM (Comité para a anulação da dívida do terceiro mundo), ou Jean-Luc Mélenchon, que nela encontra muitas semelhanças com as suas teses constitucionalistas, que parece não ver nada, para além da ponta do seu nariz anti-capitalista.
Maravilha da desinformação. Um acontecimento tão considerável como uma verdadeira revolução democrática, tal como nunca se viu na Europa, pode-se produzir sem que a imprensa, o Google, se permitam dizer o que quer que seja.
Obviamente que para a consolidação anti-democrática em que vivem a maior parte dos países europeus, o exemplo da Islândia, não deve fazer escola, visto que nos nossos regimes policiais, ainda mostram a capacidade que têm de bloquear completamente a nossa consciência colectiva.
Gostaríamos imenso de saber mais sobre esta revolução na Islândia.
Há meses que Paris se está entretendo com as reportagens muito alargadas no país dos caçadores de baleias e outras utopias.
Mergulhar nos banhos quentes da revolução democrática, cria certas invejas, sobretudo do ponto de vista do coração do nosso inverno securitário.
Você tem que imaginar a 25 "cidadãos comuns" que se vão debruçar sobre a Constituição ideal.
O espírito da humanidade de que eles se devem revestir.
Aí nós veremos provavelmente que não é difícil fazer melhor do que todas as personagens pseudo-democráticas, que até à data o fizeram nos cinco continentes.
Este artigo, que se quer um apelo, servirá para que tenhamos mais informação sobre esta extraordinária história islandesa.
Podem escrever para: michelsitbon@gmail.com, que eu publicarei com todo o prazer.
Um dossier que faremos sobre a revolução islandesa, tentará juntar os artigos que se podem encontrar sobre o assunto.


1º TEXTO DE JEAN TOSTI


16 de Dezembro de 2010

QUANDO A ISLÂNDIA REINVENTA A DEMOCRACIA

Desde sábado 27 de Novembro, a Islândia tem uma Assembleia Constituinte composta por 25 cidadãos, eleitos pelos seus pares.
Seu objectivo: reescrever inteiramente a Constituição de 1944, não esquecendo especialmente as lições da crise financeira que em 2008 atingiu duramente o país. Depois desta crise, que está longe de ser recuperada, a Islândia tem experimentado uma série de mudanças bastante espectaculares, a começar pela nacionalização dos três maiores bancos, seguida pela demissão do governo de direita, sob pressão popular.
As eleições legislativas de 2009 levaram ao poder uma coligação de esquerda, formada pela Aliança (um grupo de partidos composto por social-democratas, feministas e ex-comunistas) e o Movimento dos Verdes de esquerda.
Foi a primeira vez que tal aconteceu na Islândia, bem como a nomeação de uma mulher, Johanna Sigurdardottir, como primeiro-ministro.
O novo governo encontrou-se imediatamente face a um problema espinhoso: o pagamento aos Países Baixos e ao Reino Unido de uma dívida de 3,5 biliões de euros, após o colapso do banco online Icesave, cujas operações eram principalmente orientados por esses dois países.
Sob pressão da União Europeia, à qual os social-democratas desejavam aderir, o governo fez votar em Janeiro de 2010 uma lei que autoriza este reembolso, o que, corresponderá para cada islandês ter de pagar durante oito anos, um montante de cerca de 100 euros por mês.
Entretanto o presidente da Republica recusou-se a ratificar a lei, o que obrigou a que o texto fosse submetido a um referendo.
Mais de 93% dos islandeses votaram contra o pagamento da dívida (06 de Março), e portanto o problema contínua por resolver.
É neste contexto que a Islândia decidiu modificar a sua Constituição, que na verdade nunca tinha sido escrita: quando em 1944 foi proclamada a república, contentaram-se em copiar as grandes linhas da Constituição da Dinamarca, país de quem a Islândia dependia há várias décadas substituindo simplesmente a palavra "rei" por "presidente".
É portanto uma nova constituição, que se trata de reescrever completamente e por isso decidiram atribuir ao povo, a decisão soberana.
Nessa ocasião foi feito um apelo às candidaturas (todos podiam participar, com excepção dos eleitos nacionais, desde que tivessem mais de dezoito anos de idade e fossem apoiadas pelo menos por trinta pessoas), o que foi respondido por 522 cidadãos e cidadãs.
É entre eles que serão eleitos os 25 constituintes.
Estes últimos começaram a reunir-se em meados de Fevereiro e terão de apresentar uma versão antes do verão.

Entre as propostas que surgem em maioria, devemos assinalar a separação entre Igreja e Estado, a nacionalização dos recursos naturais e uma clara separação de poderes executivo e legislativo.
Não nos esquecemos que a Islândia é um país pequeno com cerca de 320.000 habitantes.
Entretanto ela dá uma grande lição de democracia aos grandes estados como a França: lembramos que no nosso país, a reforma constitucional de 2008 foi totalmente desenhado no Palácio do Eliseu, e os parlamentares só a adoptaram á segunda tentativa, depois de ter sido submetido durante semanas a pressões intoleráveis da parte do chefe de Estado.

2º TEXTO DE JEAN TOSTI

09 de Março de 2011

ISLÂNDIA:A ODIOSA CHANTAGEM

O presidente da Islândia, Ólafur Ragnar Grímsson República acaba de recusar pela segunda vez, a promulgação da lei chamada "Icesave" permitindo que o Estado a reembolsar os Países Baixos e o Reino Unido, por 3,9 bilhões de euros relativos a falência de um banco on-line.
Assim, pela segunda vez, ao abrigo do artigo 26º da Constituição, o povo terá que votar por referendo sobre esta lei.
Para desgosto do governo e dos mestres da finança global.
Em um artigo anterior que enfatizou o avanço democrático que foi a criação na Islândia de uma Assembleia Constituinte formada por 25 cidadãos, eleitos pelos seus pares.

O artigo conheceu um sucesso inesperado e o reverso da medalha, tem sido a frequência com que vários sites ou blogues têm distorcido a "revolução islandesa”.
Coloquemos as coisas no seu devido lugar: na realidade, uma série de "cassaroladas" provocou a queda em 2009, do governo de direita e sua substituição por um governo de esquerda, mas este último era conduzido em grande parte por social-democratas, bastante semelhante ao nossos, cujo principal desejo é o de aderir à União Europeia.
Não havia nada de muito revolucionário nisso.
Em plena crise, nacionalizaram os três principais bancos do país.
Desde então, dois deles já foram objecto de reprivatização.
Quanto à Assembleia Constituinte, não pode começar seu trabalho, como previsto em 15 de Fevereiro, porque a Suprema Corte anulou a eleição dos seus membros, com o pretexto de que as eleições não tinham respeitado suficientemente, as regras de confidencialidade.
Portanto, não se terminou de falar da Islândia e do caso Icesave, até por causa dele.
Lembre-se que logo que o banco Landsbanki foi nacionalizado, o Estado islandês não compensou os clientes estrangeiros, que eram principalmente ingleses e holandeses, da filial online do Icesave.
O Reino Unido e os Países Baixos têm feito por seu lado pressão, para que a Islândia pague a a estes dois estados, a conta estimada em 5 bilhões de dólares, ou seja 3,9 bilhões de euros.
Um acordo inicial arrancado com forceps, votado por uma pequena maioria do parlamento islandês, mas, apoiados numa petição assinada por 25% do eleitorado, o presidente da Republica recusou-se a promulgar a lei, do que resultou o primeiro referendo, realizado em Março de 2010.

Resultado: 93% "não", a Islândia não pagará.
Mas as negociações foram retomadas nos bastidores, o que resultou no início de 2011 um acordo muito menos prejudicial para a Islândia: o reembolso pode ser repartido por 30 anos (2016-2046) ao invés de oito.
Quanto á taxa de juro fixada inicialmente em 5,5%, é agora de apenas 3% para a dívida holandêsa e de 3,3% para a do Reino Unido.
É um bom negócio, declara o governo que, depois que o Parlamento votou a nova lei Icesave, expressou confiança de que o presidente desta vez, vai apoiar o acordo.
Mas uma nova petição contra o pagamento recolhe 42 mil assinaturas, cerca de 20% do eleitorado.
Em 20 de Fevereiro, Ólafur Ragnar Grímsson recusa-se a assinar a lei.
É consternação total na “selva” política islandesa.
Será portanto necessário fazer um novo referendo, que foi marcado para 09 de Abril.
Desde então, e de maneira muito mais virulenta do que no ano passado, as pressões estão a aumentar, para forçar o povo da Islândia a reverter seu voto.
Todas as ameaças servem: desde o bloqueio às exportações da Islândia, incluindo produtos da pesca, a cessação da ajuda do FMI; bloqueio das negociações de adesão à União Europeia (quando se vê a forma como a Grécia e a Irlanda são tratadas, isto é uma coisa boa!), etc.

E depois ainda dizem aos islandeses, que devem compreender como o Reino Unido e Holanda foram generosos para com eles.
Estes dois países não irão mais longe e se vocês disserem não, o caso continuará nos tribunais, onde então a factura será certamente mais salgada.
E como se tudo isso não chegasse, eis as agências de notação que se intrometem na votação islandesa.
Num comunicado datado de 23 de Fevereiro, a Agência Moody's não vai por menos: "Se o acordo for rejeitado, desclassificaremos o rating da Islândia para Ba1 ou abaixo, com o efeito negativo que advirá para a normalização económica e financeira do país. "
E a agência acrescenta que, se o voto for positivo, relevarão sem dúvida a perspectiva da nota actual (Baa3) para" estável " contra a actual "negativa".
Tudo isto faz lembrar a persistente chantagem que levou os irlandeses a aprovar Tratado de Lisboa em 2009.
Sem repetir um por um os argumentos acima mencionados, há um que merece uma atenção especial: o Reino Unido e na Holanda processarão , a Islândia nos tribunais e ganharão.
Uma tal afirmação contestada entretanto por numerosos juristas, pressupõe que ambos os países têm o direito de exigir que a Islândia transforme uma dívida privada, em dívida pública.

Nada é menos seguro.
E mesmo que se chegue a "provar" pulverizando os textos europeus, seria moralmente aceitável que os contribuintes islandeses fossem forçados a pagar estas dívidas?
Que o acordo proposto aos islandeses é mais favorável do que o anterior, é inegável, mesmo admitindo que a taxa proposta, é uma taxa fixa.
Mas a verdadeira questão não é essa: mesmo com os prazos de reembolso alargados, uma dívida ilegítima permanece ilegítima e não deve ser paga.
Se o povo islandês voltar a expressar um voto negativo, será um forte sinal para os outros países europeus estrangulados pela dívida.
Isto é sem dúvida o que mais temem os senhores das finanças (1) provavelmente, daí que a sua determinação de exigir o pagamento de uma quantia bastante modesta, quando comparada com a fortuna que o governo britânico teve de gastar, para salvar a sua próprios bancos.

NOTAS:
(1) Em janeiro de 2010, Dominique Strauss-Kahn, diretor-gerente do FMI, estimava que existam obrigações internacionais a respeitar pelos países, e que a Islândia, "não podem ser imunizadas pelo que foi feito pelo seu sector financeiro.

http://www.news-banques.com/islande-strauss- kahn-fmi-espere-une-solution-rapidement-sur-icesave/012113195/

Sem comentários: