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quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A FACE OCULTA

E A FACE VISÍVEL

Já há algum tempo que estava tentado trazer ao Blogue, a questão do processo designado por “Face Oculta”.
Só esperava que viessem mais elementos ao nosso conhecimento, para nos debruçarmos em profundidade sobre este tema, que se reveste de uma importância vital para a sobrevivência deste país, como país democrático e com alguma esperança de que terminando o pântano em que alguns dos nossos políticos o estão mergulhando, possamos acreditar que está aberto o caminho para sentir orgulho de sermos portugueses.
Entretanto, ao ler texto que colocamos a seguir e que foi publicado com ligeiras alterações, no Jornal do Fundão, concluímos que ele constituía desde já, um libelo digno de ser avaliado e ao mesmo tempo, colocava algumas das principais questões que este problema levanta a qualquer cidadão honesto e que se preocupa com o futuro deste desafortunado país.
Colocando já a maior parte dos elementos deste negro processo, em que a maioria esmagadora dos dirigentes políticos do Partido dito “Socialista” está envolvida ou a tentar camuflar, ele ajuda-nos a perceber desde logo, que têm de ser tomadas medidas radicais urgentemente, para travar o estado de degradação a que chegámos, não só no campo da economia, como nos princípios básico em que assenta a dignidade de um país.
Vejamos então o texto em referência:

DO ESTADO DE CLASSE

"...Intimamente ligado ao lucro e ao enriquecimento ilícito o aumento dos casos de corrupção crescem a par de integração de Portugal na globalização capitalista da economia; ao aumento dos casos sob investigação criminal não corresponde o aumento de condenações: «nos grandes ninguém toca»"
José Paulo Gascão - 20.11.09
O processo «Face Oculta» é mais uma achega para o que a generalidade do país suspeita: são inúmeras as redes de corrupção que enredam o poder político. Do que se conhece do processo, sem recorrer a fugas ao segredo de justiça, este caso apresenta no entanto como novidade o facto de políticos, banqueiros e altos responsáveis de grandes empresas públicas e privadas, já entrarem em teias de corrupção montadas e dirigidas por um sucateiro…
Nos partidos do arco do poder em cada país – partidos da direita tradicional e os “socialistas” – o recebimento de dinheiro em notas ou depósitos em offshore é moeda corrente.
Na Alemanha, por exemplo, o fisco aceita como despesa o pagamento de luvas a estrangeiros (corruptos) que facilitem negócios às empresas alemãs; e se a legislação dos países onde estão situadas as empresas filiais o não o admitir, contabiliza-se a verba na empresa-mãe e tudo se resolve nas contas consolidadas. Mas para não citar apenas a Alemanha, também poderíamos falar da Itália, com ou sem Berlusconi, dos EUA, Inglaterra, França, Espanha, Holanda, etc..
Mas a sucessão de casos de corrupção sob investigação criminal não é uma fatalidade dos dirigentes políticos, vítimas da inveja ou de uma qualquer conjura dos tribunais com a Polícia Judiciária, estruturas que em Portugal têm participação directa – embora diferente – do governo na nomeação do cume da hierarquia.
Duas constatações se podem já fazer: intimamente ligado ao lucro e ao enriquecimento ilícito o aumento dos casos de corrupção e a inversão/ausência de valores crescem a par da integração de Portugal na globalização capitalista da economia; ao aumento dos casos sob investigação criminal não corresponde o aumento de condenações: «nos grandes ninguém toca».

A QUEM SERVE O ESTADO?

Aparentemente acima da sociedade e das classes, o que a presente crise desmente, «O Estado é uma organização especial do poder» (…) dotada de «um aparelho militar e burocrático constituído especialmente pelas forças armadas, pela polícia, pelos tribunais, pelos órgãos legislativos e executivos, pelo funcionalismo», que ao longo dos tempos foi sendo aperfeiçoado pela classe dominante, através dos partidos que a servem.
Mais do que a fofoca das escutas telefónicas divulgadas na imprensa sobre a «Face Oculta» (que propositadamente não abordamos) regulamentadas por uma lei que permite tantas interpretações quantas as opiniões interessadas dos inúmeros especialistas, importa questionarmo-nos porque abandonou a imprensa, no final da passada semana, as notícias sobre a rede tentacular dirigida por um sucateiro enriquecido, e concentrou a sua atenção em conversas de Armando Vara com o Primeiro-Ministro que nada tinham a ver com a «rede tentacular»?
Procurando apresentar o Estado como uma organização acima da sociedade e das classes, a grande burguesia sabe a importância da credibilidade do Estado para a prossecução do seu fim principal: o aumento da taxa de lucro. A taxa de lucro máximo, principal elemento de orientação do processo de produção capitalista, só é possível através domínio do Estado e dos seus elementos constitutivos/repressivos. Mas para isso é preciso que Este seja credível junto das massas iludidas e crentes na falsa neutralidade do Estado perante os interesses das diferentes classes.
O processo «Face Oculta» soma-se à sucessão ininterrupta de escândalos que de há muito envolvem em Portugal a banca, grandes capitalistas e grandes empresas e o aparelho de Estado. O grande capital não pára de se ver envolvido em investigações que, através do seu aparelho de Estado, procura adiar até uma conveniente prescrição ao abrigo de lei existente ou a fazer, de que são exemplos maiores a Operação Furacão, que envolve os principais bancos portugueses em casos de que não se sabe os contornos mas que já se sabe resultarem em fuga ao fisco, o caso BCP, BPN, BPP…
À defesa da credibilidade ameaçada do seu Estado tudo o grande capital sacrifica. Por isso, se tal for necessário, mesmo um Primeiro-Ministro ou um responsável pela supervisão financeira são para a burguesia matéria descartável, mas reciclável em altos cargos internacionais ou numa qualquer grande empresa nacional.

OS TRIBUNAIS – ELEMENTO DO ESTADO DE CLASSE

Constitucionalmente definidos como órgão de soberania, os tribunais são um dos elementos constitutivos do Estado de classe. Se com a Revolução de Abril foram dadas aos tribunais as condições que lhe permitiram actuar como órgão independente e soberano, com a reforma constitucional de 97 os juízes passaram de únicos titulares a minoritários no Conselho Superior de Magistratura (CSM): 8 juízes contra 9 elementos designados pelo poder político: dois designados pelo Presidente da República 7 eleitos pela Assembleia da República.
Esta decisão da Assembleia da República é uma intromissão no órgão de soberania tribunais, onde os seus titulares ficaram em minoria perante o poder político, e com eventuais efeitos na progressão da carreira dos juízes, pois é o CSM, com base nos relatórios das inspecções, que atribui as suas classificações, o que determina a sua progressão na carreira.
Apesar disso, e voltando à rede tentacular, não deixa de ser surpreendente a não abertura pelo CSM de um rigoroso e transparente inquérito que explique como soube o sucateiro enriquecido no dia 5 de Junho que o Tribunal da Relação do Porto o absolvera, quando a sentença só foi assinada 4 dias depois? O relator do processo, «desembargador Cândido Lemos», explica que «Talvez as partes o tenham consultado no processo», o que é peremptoriamente desmentido pelos 2 outros juízes e pelo escrivão. Um dos outros desembargadores do processo, recorda «que nessa altura os documentos eram entregues em papel por Cândido Lemos, que só há algumas semanas começou a usar o correio electrónico». (Todas as citações são do Público de 12 de Novembro de 2009 e até à data que escrevo este texto não foram desmentidas nem rectificadas).
Não sendo lícita qualquer especulação sobre o assunto (e por isso não transcrevemos algumas declarações entre aspas do Desembargador relator), a não abertura de um rigoroso inquérito pelo CSM só pode contribuir para o aumento do descrédito da Justiça que através do poder político vem sendo lançado sobre os tribunais.
Tal como o sistema capitalista que a criou, a democracia representativa passou o prazo de validade. O que hoje conhecemos como democracia não passa aliás de uma «ditadura da grande burguesia de fachada democrática», onde o povo soberano aliena a soberania entre os actos eleitorais.
Só quando o povo se assumir como sujeito da história será possível construir um Estado democrático, ao serviço do povo e do país e começar a edificar uma democracia participativa com uma participação crescentemente alargada de todos.

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